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terça-feira, 31 de agosto de 2010

somente

mastigar a vida
com a boca do outro,
sentir no olfato
o cheiro estranho
de nós...
aos olhos míopes
calçar de óculos
e tempestades
de areia
a imagem perfeita
que o espelho embaçado
desenha de embargo
nessa voz
que somente chora
uma dor que não sente.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Uma paráfrase

Ao teto
a saciedade
varrida de brisa
ventila a dor
que nessas veias
ardem,
ar de vertigens
que incendeia
o virgem instante
de mornez e tédio.
No fim, semblante
aliviado
e poesia,
arquiteto de fazer
o tempo passar
tranquilo e fresco.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

trem periférico

Sentada neste banco,
marcada de estrada e pó,
a vida de fúria
vestida de branco
desatada de nó.

É uma estação de madeira,
um trilho de ferro,
uma pequena maneira
de dissimular
o nada que espero.

Encontrei um pretérito
no meu dia de sombra,
um atalho profundo
nesse trem periférico
para meu sonho de mundo.

E em mim zombam
as sacolas e os papéis
espalhados na janela,
um pileque e um surto
nesse curto espaço
de sentinela...

Sim, sinto nela
o veneno,
a espuma borbulhante
nessa xícara de instante
sendo o café pequeno

que as minhas órbitas
e esferas esfregam na rua
a inquietação que me consome
pelo caótico itinerário
de procura e fome.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

esboço

quem fere
na tentativa de desamor,
fuga e estilhaço,
não encontra
em seu labirinto
a porta de sua ida,
mas a que fica...
e é a confusa
inerência
de fazer parte
dos meus abismos.

domingo, 22 de agosto de 2010

Inalterável

Aos excessos de mim
a suma essência do que me fica
de ser pedra,
areia absoluta
que me destitui
a cada instante
para um novo instante.
Por fim,
sem algibeiras
nem estribos,
rumo norte e sul,
leste e oeste
para meu cimo
selvagem
de amanhecer
homem,
dormir rato
e permanecer
inalterável.

De carne e sonho

O sempre é tudo e nada
um pé descalço perene
pela estrada...
As gargantilhas do desespero,
o tombo da lucidez,
a líquida imagem
do amor: são tudo mar,
tudo estrelas,
constelação de versos
que atrela em minha alma
o desejo consistente,
a fome de sal e pedra,
a lânguida insensatez
de me construir
de verbo,
de me destituir desse
aço irreversível de razão
e me fazer
de carne e sonho.

Lacunas

Sou pássaro,
hoje e sempre
ao léu instante
desse tempo,
um farfalhar
de folhas
ao véu
movimento
de sonhos
e amores
que se chegam
e se vão
como um vento
lento e sóbrio
de abrir
lacunas
em meu coração.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Gruta

Estes anos me são o tempo,
invento sóbrio de nós.
Estas tábuas envergadas
que marcam a lucidez
em minhas costas,
mostruário de ser pedra e pó.

Este tempo me é um vento
que contemplo com a janela
entreaberta das minhas pálpebras
e ladeio com um dormir profundo,
pois aos sonhos, inconfundível,
me entrego, me mudo.

Este vento me é um lençol,
gruta do inevitável,
onde harpeio de instante e lida
minha vida de andante,
Quéops no inabalável
verso de me ser estrada e só.

caixinha de segredos

ao acordar, a pena, leve e suave desfazendo a condolência. de tarde é um voar para além desses olhos, pois a beleza mais de verniz é aquela ali quietinha, nua e bem guardada: numa caixinha de segredos esmiuçada de tanta bobagem, as fitas coloridas daquele sorrir...
guardava tudo do dia numa bolsa, miçangas do instante, depois, separava o joio das horas e embrulhava com as mãos o que sobrava: receita de ser feliz.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

proeminência

a tarde cai
dominical e crepuscular,
cai como sentinela do dia
que se esvazia
na espera
da proeminência
do amanhã...

domingo, 8 de agosto de 2010

Em branco e preto

Pelas arestas do meu dia
eu vejo um sol, nuvem estilhaçada,
e a poeira do sonho nessa arritmia:
bloco de pedra, passos na calçada
empurrando a negligência
num carrossel de vida parca.

Partem os homens,
choram as mulheres,
um portão fechado que consome
e no cerco que me fere
é a paliçada dos que perdem
sem ter chance de usar um nome.

Em branco e preto
é o verbo azedo, a vida morna
estancada como cinzas num cinzeiro,
dispersada em baforadas
impregnando de fuligem os meus pulmões
que pinta a textura do meu dia
com a paisagem desses corpos ébrios.

Ela chegou com seu cedro de arame
desembainhou a tua espada de navalha
e amarrou as suas paredes com fiapos...
Se cobre agora com esse teto de papelão
porque a sua solidão é uma ausência
silenciada nesse pedaço frio de chão...

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

A novidade

Ah, dizei!
O alaranjado dos teus versos
com o sabor café
das minhas palavras
não são exatamento
o tom absurdo e imperfeito
nessa arritmia desrimada
de poesia?
Sim, o concreto
é o nosso teto frio
que cobre de escombros
essa beleza quase branca
gravada em grafite e porcelana...
Uma xícara de chá, meu bem!
Há alguns nós para distorcer
a imagem da minha face
e desatar o cobre
desencapado da nossa solidão...
- Não há novidade
nessa realidade,
apenas distorção dos sonhos
que almejamos construir
com esses fios de agora.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

a flor dos capinzais

a rua fria
cheia de noite.
o vento açoitando
um rosto sem
esperança...
por onde anda
essa ilusão?
os olhos secos
bebem as vidraças,
os olhos cheios
de vida branca
e cinza.
a boca bebe
a fome,
come agora o nome
no inusitado
das horas...
matar a vida
a cada dia
enquanto
a morte não chega.
não creio mais
no ineditismo
das coisas -
proclamo sim
a palavra nova
que a velha
ausência -
flor dos capinzais -
tange de janela
no meu mundo
de concreto e lida.

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